Tulio Pinheiro, atuário, MIBA 1626
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Uma decisão do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), no Acórdão nº 2212/22, discorreu sobre a possibilidade de utilização dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) para a amortização do déficit atuarial.
A consulta formulada pelo Prefeito de Bela Vista do Paraíso ao TCE-PR indagava sobre a legalidade de utilizar a cota de 70% dos recursos do FUNDEB, destinada à remuneração dos profissionais da educação básica, para amortizar o déficit atuarial do RPPS municipal. A questão ganha relevância no contexto da crescente pressão sobre os gestores municipais para equilibrar os fundos previdenciários locais, sistematicamente deficitários. A egrégia corte de contas fundamentou sua decisão em uma interpretação rigorosa da Constituição Federal, em especial do artigo 212-A, que destina recursos específicos para a educação básica, bem como na Lei nº 14.113/20, que regulamenta o novo FUNDEB. Os dispositivos legais estabelecem que os recursos do FUNDEB devem ser utilizados exclusivamente para a manutenção e desenvolvimento da educação básica, o que inclui a valorização dos profissionais da educação pela via da remuneração.
A Emenda Constitucional nº 108/2020, que criou o novo FUNDEB, estabelece que uma parcela dos recursos deve ser destinada exclusivamente à remuneração dos profissionais da educação básica em efetivo exercício, vinculação esta reforçada pela Lei nº 14.113/20, que em seu artigo 26 define que no mínimo 70% dos recursos anuais totais dos Fundos devem ser direcionados para essa finalidade. Nos artigos 26 e 29 a Lei do FUNDEB detalha as finalidades específicas para as quais os recursos podem ser utilizados e lista expressamente as despesas vedadas, entre elas o pagamento de aposentadorias e pensões, ou qualquer outra forma de financiamento do RPPS.
O TCE-PR, ao analisar a consulta, concluiu que a utilização dos recursos do FUNDEB para amortização de déficit atuarial no RPPS violaria as finalidades constitucionais e legais desse fundo, a decisão destacou que o aporte para a amortização do déficit atuarial, ainda que relacionado aos encargos sociais incidentes sobre a remuneração dos profissionais da educação, não pode ser considerado como uma despesa vinculada à remuneração dos profissionais da educação em exercício. A decisão também se apoiou em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente na ADI 5719/SP, que julgou inconstitucional a inclusão de despesas previdenciárias no cômputo das despesas com manutenção e desenvolvimento do ensino, reforçando que essas despesas não atendem ao disposto no artigo 212 da Constituição Federal.
Ao vedar o uso dos recursos do FUNDEB para essa finalidade, o Tribunal busca reafirmar a necessidade de uma gestão previdenciária rigorosa, que busque soluções dentro do próprio sistema previdenciário, sem recorrer a recursos vinculados à educação, contudo tal restrição é demasiado rigorosa, impõe aos gestores que o equilíbrio atuarial seja obtido pela revisão das alíquotas de contribuição, pela reestruturação dos benefícios, prejudicando os respectivos segurados ou pela realização de aportes extraordinários com recursos próprios do município, o que tende a agravar, ainda mais, a catastrófica situação fiscal dos entes federados.
A Portaria MTP 1467/22, contudo, permite que RPPS estabeleçam alíquotas patronais diferenciadas em função dos diferentes grupos de segurados, desde que tais tenham direito a critérios de aposentadoria diferenciados, a exemplo dos professores. O inciso III do seu Art. 53, que transcrevemos a seguir, elucida um possível caminho para solucionar o problema trazido à tona do Acórdão nº 2212/22 do TCE-PR, a saber: "as contribuições, normal e suplementar, a cargo do ente federativo poderão ser diferenciadas por massa de segurados sujeita a critérios legais de elegibilidade específicos, desde que assegurada a equidade no financiamento do RPPS e demonstrado que o plano de custeio financia integralmente o custo total apurado na avaliação atuarial". A diferenciação das alíquotas visa refletir o custo atuarial associado a cada categoria de segurados, evitando o subsídio cruzado, que é o mecanismo pelo qual um grupo de segurados, geralmente aqueles com menor custo previdenciário, contribui injustamente de maneira a cobrir os custos associados a um grupo que tem maior custo previdenciário, dentro do mesmo regime previdenciário.
A adoção de alíquotas patronais diferenciadas para grupos específicos, como os professores, conforme permitido pela Portaria MTP 1467/22, apresenta-se como uma estratégia fundamental para atingir o equilíbrio atuarial dos RPPS, principalmente se o entendimento do TCE-PR, conforme Acórdão supracitado, torne-se majoritário entre os tribunais de contas e, posteriormente, junto ao Poder Judiciário.
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